Empresa torna filmes acessíveis para cliente que não enxerga
Filmes clássicos que nunca foram lançados com recursos de acessibilidade estão recebendo audiodescrição sob encomenda de clientes com deficiência visual da empresa Cineblind.
Segundo Charles Moreira, 29, idealizador do projeto, o preço para contratar uma audiodescrição parte de cerca de R$ 100 para filmes de uma hora e meia e vai a R$ 300, no caso de longas com mais de 3 horas de duração.
Moreira, que é cego e também tem uma produtora de áudio para gravar jingles e locuções, diz que a entrega do filme para o cliente leva até 60 dias, período necessário para que a roteirista Vanusa Serafim prepare o texto da audiodescrição, o conteúdo seja analisado por consultor cego e Moreira ou outro narrador faça a gravação das inserções de informações, como aparência das personagens, cenários e ações.
Entre os filmes que já foram tornados acessíveis após pedido de cliente com deficiência estão títulos de gêneros variados como “2001, Uma Odisséia no Espaço”, “Lilo & Stitch” ,”Coringa” e “O Bebê de Rosemary”.
As produções feitas sob encomenda pela Cineblind podem tanto ficar públicas na internet para outros espectadores com deficiência como tamb~em serem mantidas particulares, dependendo da opção do cliente, diz Moreira. Quem faz o pedido também pode ser incluído nos créditos finais do filme como patrocinador da audiodescrição, conta.
Segundo Moreira, com a tabela de preços praticada atualmente, a companhia não consegue ser lucrativa. O valor é suficiente para pagar as contas, mas ainda não é possível investir mais na iniciativa e todos que participam do projeto têm outras atividades, incluindo também a esposa de Moreira, Renata Cardozo, que é formada em direito e faz narrações.
O Cineblind começou em 2017, incluindo descrições voluntariamente e disponibilizando o conteúdo em canal no YouTube em versões apenas com o som e as descrições.
Filmes como “Forest Gump”, “Titanic” e “O Rei Leão” foram incl~uídos no YouTube a partir deste formato desde 2017, conta Moreira. A plataforma, porém, pasou a ser usada com menos frequência, depois que alguns vídeos foram tirados do ar pelo sistema do YouTube indicar violação de direitos autorais, conta Moreira. Ele diz haver amparo legal para a exibição da versão sem imagem das produções para oferecer acessibilidade a pessoas com deficiência, mas evita questionar as decisões para não correr o risco de ter o canal suspenso.
Além das encomendas, a empresa segue com a produção voluntária de filmes e vem exibindo eles em lives em sua página no Facebook e deixando disponível no Portal Cegos Brasil, um repositório de conteúdo variado para pessoas com deficiência visual. Entre os trabalhos recentes estão a audiodescrição dos filmes da série Harry Potter.
Para o futuro, Moreira diz que uma das metas é criar um site para que a Cineblind tenha um espaço próprio para hospedar suas produções.
Conforme a capacidade de investimento aumente, Moreira também deve investir em mais equipamentos para montar um estúdio em que a equipe possa trabalhar junta —hoje cada pessoa que colabora com a Cineblind atua da própria casa.
Com isso, ele espera atender a uma maior demanda por audiodescrição que acredita que deverá vir das plataformas de streaming, das emissoras de TV e das distribuidoras, conforme elas passem a oferecer mais acessibilidade.
Para Moreira, a audiodescrição amplia o conhecimento de pessoas com deficiência visual, ao permitir que elas recebam mais informações sobre diferentes locais do mundo. A ferramenta também amplia o repertório de gestos para expressar emoções, pois, a partir dela, muitos cegos ganham mais familiaridade com ações como franzir a testa ou dar de ombros, diz, citando frases frequentes em roteiros de audiodescrição.